terça-feira, 18 de maio de 2010

14 de maio - Viagem para Jaipur

Acordei por volta das 9h da manhã e fui à varanda do quarto do hotel. Havia uma linda vista para o vale, com a cadeia de montanhas ao redor. Realmente um lugar privilegiado.
Era a primeira vez que via uma grande porção de verde, pois na planície lá embaixo todas as terras eram cultivadas. Percebi no mapa que estávamos na cadeia de montanhas do Himalaia, próximos da fronteira com o antigo Tibet, atualmente China, ao norte, e algumas poucas centenas a leste encontraríamos o Nepal, o qual Ram comentou que a moeda indiana lá vale muita coisa. Pois é, não existe limite para pobreza.
Já lá embaixo é o vale do Ganges, e  trata-se de uma gigantesca planície, com várias cidades espalhadas, e quase toda área cultivada. Ram comentou que a cidade que víamos lá de cima se chamava Dehradun, e que era uma cidade grande. O último censo de 2001 fala em 450.000 habitantes, mas acredito que já tenha mais de 1 milhão. Entendi então como é possível ter mais de 1 bilhão de pessoas neste país, todos os lugares são muito ocupados, e existem muitas grandes cidades. Delhi é uma cidade de 18 milhões, Mumbai tem mais de 20 milhões, Kalcutá tem por volta de 22 milhões, e daí várias outras com muita, muita gente. Em todo lugar que se passa é muita gente que se vê. Sabem qual é o primeiro impacto? Poluição.
Em todo horizonte que olho por aqui vejo o céu levemente marrom, e lembrei da Grande Nuvem Marrom, uma gigantesca nuvem de poluição que cobre toda a Índia, e daí passei a observar na beira da estrada uns montinhos de bolinhos marrons, e que Ram me confirmou que era esterco de animal para o pessoal cozinhar. Por conta disto muita fuligem é lançada no ar e daí a poluição é algo que cobre todo país.
Saímos para passear por Mussoorie e conhecer a cachoeira. Um lugar muito bonito com uma cachoeira de água gelada cristalina descendo das montanhas. Tirei algumas fotos.
A propósito, estou tirando fotos a ermo, sou péssimo fotógrafo, e também tenho tirado muitas fotos duplicadas para ver qual fica melhor, e muitas de dentro do carro, sem nem pedir pra Ram parar ou diminuir , nem abrir a janela, de modo que meu registro visual está bem meia boca. Tenho feito vários vídeos também, muitos bem quebrados. E sei que não terei tempo para organizar ou publicar nada disto. Peço desculpas aos curiosos, mas me concentro mais em observar do que registrar.
Eis o link para as fotos. Quem quiser ver os vídeos me peça que compartilho o diretório. Ah, desculpem-me também pelo tamanho das fotos. A câmera é de 14 MegaPixels e daí os arquivos ficaram enormes, e agora não terei tempo para diminuir a resolução. Quando fizer isto aviso.
Bem, já estava na hora de voltar para Delhi para seguirmos para Jaipur, e não fiz questão de conhecer mais da cidade. Partimos por volta das 15h, e calculei que chegaríamos em Delhi por volta das 21h. Ledo engano, a viagem de volta foi mais lenta ainda, haviam milhares de caminhões andando a estonteante velocidade de 30Km/h, e chegamos na famosa Connaught Place por volta da meia-noite.
Descemos para irmos a um ATM sacar dinheiro para poder pagar as diárias dos hotéis ao amigo de Ram. Andamos pela praça em frente ao templo dos macacos. O piso da praça era de pedra clara e irradiava um calor intenso, como quando passamos na frente de um forno muito quente. Haviam várias pessoas dormindo pelo chão, e outras andando e conversando, tudo isto à meia-noite.
Sacamos dinheiro no ATM e voltamos para o carro, e eu pensando que no Brasil nunca conseguiria sacar aquela quantia àquela hora, nem me sentiria tranquilo andando pelas ruas daquele jeito. Percebi que aqui, apesar da quantidade de pessoas, não existe violência como estamos acostumados a ver. Tenho pensado sobre o assunto e acredito que isto esteja intimamente relacionado à religião hindu, que é absolutamente presente em todas as pessoas e lugares. Prega-se a vida em comunidade e a tolerância com tudo, além do respeito absoluto pela vida e a idéia poderosa de que esta é apenas uma das vidas de muitas que sua alma pode ter, sendo que se você está em uma situação ruim hoje é porque não seguiu um caminho justo na vida anterior, e deve seguir o caminho da retidão espiritual se quiser melhorar nesta ou na próxima vida. Desta forma não vi nenhuma demonstração ou comentário sobre violência física de nenhuma natureza.
Claro que com tanta gente junta, carente de recursos, como aqui, nada poderia ser tão perfeito. Percebi sim que ocorrem furtos, especialmente nos grandes centros. Mas nada se compara com a violência que agride e mata como costumamos ver no Brasil. No geral o povo aqui é extremamente pacífico, e a polícia exerce seu controle das multidões com um pequeno pedaço de pau, que nem se compara com o peso de um cassetete. Não carregam armas.
Saímos de Delhi em direção a Gurgaon, para encontrarmos com Lokesh. Ram estava bem cansado e percebi que gostaria de dormir para seguirmos no dia seguinte para Jaipur, mas a intenção de Lokesh era irmos imediatamente, e Lokesh não teve como dizer não, além de ser contratado, ele é de uma casta inferior. Voltarei ao assunto depois.
A estrada para Jaipur era bem melhor do que as que tínhamos pegado para o norte, com duas pistas de 4 vias. Mas a quantidade de caminhões era gigantesca, de modo que o tempo de viagem previsto era de 4:30h para 230Km de distância. Nossa velha velocidade de cruzeiro de 50Km/h.
No caminho Lokesh pediu para pararmos em uma loja de bebidas, e comprou cervejas. Lá se foi minha abstinência de álcool, já imaginava. Mas me chamou atenção a tal lojinha, gradeada e iluminada, com as prateleiras repletas de bebidas, e nem uma mesinha pra sentar, nem pessoas bebendo pelas redondezas. Como falei, bebida alcoólica é muito controlada aqui, e Lokesh me falou que aquele vendedor teve que pagar  10 milhões de rúpias (!!!) para o governo pela concessão para uma loja de bebidas. São 400.000 reais num país em que um carro custa 8.000. É quase uma lei seca, e começo a entender porque.
Mas como ia dizendo, a estrada estava lotada de caminhões, e chegou a parar por uns 30 minutos devido a um suposto acidente mais adiante, mas a partir daí seguiu bem.
Chegamos em Jaipur ao amanhecer. Acordei de um cochilo e comecei a notar a cidade no meio de uns morros secos, tudo cor de terra seca, bastante pedregulhoso, com uns fortes no alto dos morros, e muros enormes que seguiam todo topo das colinas, lembrando a muralha da china numa escala bem menor.
Passamos por um grande portal em um estilo parecendo árabe e continuamos pelas ruas da cidade. Poucas pessoas andando nas ruas naquele horário. Um pouco à frente vi um garoto caminhando em cima de um enorme elefante e falei meio abismado, ainda sonolento e em português "Um elefante!". Fiquei impressionado ao passar de carro ao lado daquele animal gigante. Ram comentou que haviam mais de 100 elefantes pela cidade.
Estávamos indo para o hotel, as ruas ainda meio vazias. Vi um garoto meio maltrapilho andando de bicicleta pela rua, alguns cachorros latiam na direção dele e ele foi se afastando mais para o meio da rua. Ram devia estar bem cansado e não deu distância, o garoto foi chegando mais e mais e quando vi estava quase se jogando na frente do carro a dois metros adiante. A única reação que consegui ter foi tapar os olhos com ambas as mãos, soltando de susto em português um "puta que pariu!", enquanto ouvia um baque surdo do carro batendo no garoto.
Ram parou assustado uns 30 metros adiante. Lokesh acordou e perguntou o que foi e Ram respondeu em hindi o que entendi como que o garoto se jogou na frente do carro. Olhei para trás e o garoto estava de pé, segurando a bicicleta, ainda preocupado com os cachorros que latiam pra ele. Ram reclamou do espelho retrovisor que estava quebrado, e seguiu viagem. Fiquei meio sem ação, sem saber se devia pedir para pararmos e irmos lá ver se estava tudo bem com o menino, sem saber se devia agir ou simplesmente observar, e calado permaneci. O garoto não aparentava ter se machucado, mas ainda estou tentando compreender como funcionam os valores e respeito nesta cultura. Sou tratado com uma distinção quase serviçal, mas os de casta baixa são naturalmente desprezados, e aceitam humildemente tal situação.
Chegamos ao hotel, e fui dormir exausto.

Um comentário:

  1. Não consigo acessar o link para as fotos, o servidor do meu trabalho bloqueia o site.. :(
    O jeito é ver de casa.. ou então se tiver picasa.. beijos

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